29.11.16




"Passámos em Cadis, depois das barricadas de Dezembro, no momento das guerrilhas e da anarquia liberal. Muita gente morreu nas ruas da cidade, muitos homens tinham seguido nos partidos, e, disperso pelos montes, não haviam voltado ainda. Isto, que não influenciava materialmente a vida da cidade, tirava-lhe contudo alguma coisa do seu impaciente movimento. À noite, porém, as ruas alumiadas claramente, cheias de lojas e de luz, estão apinhadas de gente. As mulheres passam aos grupos, embrulhadas nos mantons, que são ainda o vestuário de Cadis, e às esquinas, imóveis com a lanterna na mão, os "serenos" vigiam.
A um canto de rua, numa casa grande e clara, surpreende-nos um quadro verdadeiramente espanhol: a um balcão alto, recortado, colorido, na abertura das cortinas escuras, molemente abertas sobre um fundo alumiado de sala, destacam-se três figuras femininas. São três mulheres vestidas de negro, conversando, tomando ar, olhando a rua. Nas atitudes, no vestuário, nos tons harmónicos de luz e de sombra, num certo mistério-ambiente, era certamente um quadro dos velhos costumes espanhóis do tempo de Isabel.."

Eça de Queiroz, 1869, in O Egipto e outros textos sobre o médio oriente

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